
“Onde estão os dados?”: Porque é que ainda aceitamos decisões políticas sem provas em 2025
- Daniela Santos
- 4 de ago.
- 3 min de leitura
Vivemos num mundo onde a inteligência artificial cada vez mais trabalha na previsão do nosso comportamento, os dados circulam em tempo real e as decisões de produto são testadas e ajustadas constantemente.
E no entanto, em 2025, continuamos a ver decisões políticas a serem tomadas — e aceites — sem qualquer base em evidência.
Propostas que afetam milhões são apresentadas sem indicadores claros.
Conferências de imprensa cheias de promessas, mas sem gráficos ou números.
Campanhas construídas com emoção, não com factos. E quando alguém pergunta: “Onde estão os dados?”, a resposta é muitas vezes vaga, ou simplesmente não vem.
Porque é que isto continua a acontecer?
O paradoxo: ferramentas modernas, política à antiga
Hoje temos acesso a estudos de comportamento, modelos preditivos e sistemas de machine learning que nos ajudam a tomar decisões em quase todas as áreas:
Empresas testam até o botão de um site antes de o lançar.
Aplicações adaptam-se ao nosso comportamento em tempo real.
A neurociência explica como tomamos decisões, o que nos motiva e até o que nos bloqueia.
Sabemos mais do que nunca sobre como as pessoas funcionam. E temos ferramentas que nos permitem medir quase tudo.
Mas quando os governos mudam leis, mexem na educação ou tomam decisões sobre a vida familiar, raramente mostram os dados por detrás dessas medidas.
E o mais estranho? Continuamos a seguir em frente como se isso fosse normal.
Porque é que não exigimos os dados?
É fácil dizer que “as pessoas não querem saber”. Mas não é verdade. As pessoas preocupam-se — com justiça, com estabilidade, com o futuro.
A explicação está mais no que nos faz humanos:
Emoção > Informação
O nosso cérebro reage primeiro à emoção. A amígdala (a parte do cérebro que processa emoções) reage antes do raciocínio entrar em ação.
Como explicou o neurocientista Antonio Damasio, “não somos máquinas de pensar que sentem; somos máquinas de sentir que pensam”.
É por isso que discursos que despertam medo, orgulho ou raiva ficam mais na memória do que gráficos ou estatísticas.
Viés de confirmação
Tendemos a dar mais atenção às ideias que confirmam o que já acreditamos. Mesmo quando há provas em contrário, o nosso cérebro tenta proteger as nossas convicções.
Na política, isso cria bolhas onde deixamos de questionar e só ouvimos quem diz o que queremos ouvir.
Excesso de informação
Somos bombardeados por notícias, opiniões, notificações e dados. Para gerir tudo, o cérebro simplifica.
Preferimos mensagens claras e diretas a análises complexas. O nosso sistema nervoso simplesmente não aguenta estar sempre em modo “crítico”.
Falta de confiança nas instituições
Quando as pessoas deixam de confiar nas instituições, também deixam de confiar nos dados — mesmo quando são verdadeiros.
O que sentimos sobre quem diz algo torna-se mais importante do que aquilo que está a ser dito.
Cansaço e desmotivação
Estar constantemente a tentar perceber o que é verdade e o que é manipulação cansa.
Chega a um ponto em que muitos preferem desligar. Só querem alguém que tome decisões, mesmo que não mostre provas.
E agora?
Esta questão não é sobre partidos ou ideologias. É sobre responsabilidade num tempo em que temos ferramentas e conhecimento como nunca antes.
Conseguimos medir o impacto de uma campanha em tempo real. Sabemos como as pessoas reagem a decisões. Temos formas de prever riscos sociais.
Então porque é que ainda aceitamos decisões que não mostram dados, nem resultados?
Se numa empresa pedimos métricas para cada funcionalidade, porque é que não pedimos o mesmo a quem decide sobre saúde, educação ou direitos?
Vivemos nós uma era de dados, desperdiçada?
As ferramentas estão cá. Os dados existem. A ciência também.
Mas enquanto as decisões políticas forem mais sobre performance do que progresso —
E enquanto formos mais movidos por discursos do que por provas —
Vamos continuar a viver com uma mentalidade do século XX num mundo do século XXI.
Em 2025, os dados deviam ser o início da conversa política — não aquilo que falta no fim.
Deixo a pergunta: num mundo cheio de respostas, porque continuamos a seguir quem não nos dá nenhuma?



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