Avós… entre a herança e o silêncio imposto
- Daniela Santos
- 13 de abr.
- 4 min de leitura
Atualizado: há 5 dias

No tempo em que pais e avós parecem, por vezes, em lados opostos da parentalidade. Entre a urgência moderna de educar “bem” e a sabedoria que vem do tempo, nasce um desencontro — mas também uma oportunidade.
Quando o Amor Tropeça nos Limites
Tempo…. Os pais correm…a vida corre… as notificações não param!
Entre o trabalho, as refeições saudáveis, as terapias, os grupos de WhatsApp da escola e a tentativa de manter alguma sanidade emocional, há pouco espaço para pausa — quanto mais para escuta.
E, nesse cenário onde tudo urge, há uma figura que resiste ao tempo: os avós.
São presença que abranda. Voz que vem de outro ritmo. São herança viva — afetiva, ética, cultural. Mas, paradoxalmente, são também muitas vezes postos à margem na arte delicada de educar.
A modernidade trouxe novos modelos de parentalidade: mais conscientes, mais informados, mais atentos às emoções. Mas também mais exigentes. Os pais de hoje sabem o que querem (e principalmente o que não querem repetir). E é aí que nasce o conflito.
Porque os avós — com todas as boas intenções — vêm de outro tempo. Um tempo em que palmadas ainda eram “educação”, em que as emoções eram engolidas com o jantar, em que “respeito” era sinónimo de silêncio. Muitos adaptaram-se. Outros, não. E os pais ficam ali, no meio: entre o medo de ferir os avós e a vontade de proteger os filhos.
Quantos de nós não já disseram:
— “Mãe, não digas isso à frente da Eva.”
— “Pai, hoje em dia não se faz assim…”
Às vezes, o embate não é só de ideias — é de gerações. E o que poderia ser partilha, torna-se correção. O que deveria ser aliança, vira tensão. E no meio, as crianças… que assistem, muitas vezes sem entender, ao desencontro entre as duas figuras que mais amam.
E há também aqueles momentos delicados em que os avós, ao verem os pais impacientes ou mais duros, soltam:
— “Tens de ter paciência… a mesma que eu tive contigo.”
E os pais hesitam…. Porque muitas vezes essa paciência não existiu. Existiram limites, gritos, silêncios. Mas talvez ali, naquele comentário, esteja o que todos desejam: ter sido (ou ser) mais ternos do que conseguiram.
Educar ou Cuidar?
Talvez esteja aí o ponto-chave: avós não estão cá para educar da mesma forma que os pais. Estão para cuidar. Para transmitir calma num mundo hiperestimulante. Para ensinar sem dizer. Para acolher sem julgar.
Os avós oferecem algo que os pais muitas vezes não conseguem: tempo sem pressa.
E isso, hoje em dia, é ouro. Enquanto os pais tentam equilibrar tudo, os avós sentam-se com a criança e contam a mesma história pela quinta vez. E contam com prazer. Porque ali não há agenda. Há presença.
E há também herança. Não só a material — mas a mais valiosa:
A forma de olhar o mundo.
A resistência que carregam nas rugas.
O amor que não precisa de performance.
Onde Moram as Histórias da Família
Os avós são também os guardiões da nossa narrativa.
São eles que contam como era a casa da infância, como se estudava à luz da vela, como se fazia pão ao domingo, como a avó foi pedida em namoro à porta do cinema. São testemunhas vivas da mudança dos tempos.
Num mundo em que tudo é “agora”, os avós são o “antes”. E esse “antes” pode ajudar os adolescentes a entenderem que nem tudo nasceu com o YouTube. Que houve um tempo em que se esperava. Em que se ouvia. Em que, depois do almoço, não havia bonecos animados porque era tempo do avô ver as notícias — ou a novela.
Lembro-me do meu avô, por exemplo. Quando nos visitava, já sabia: depois do almoço, era hora de Vila Faia. Não havia ponto de discussão. E mesmo assim… eram tempos de qualidade. Silêncios, cheiros de sobremesa, televisão baixa, e a certeza de que aquele momento era dele — e de quem quisesse partilhar, mesmo sem palavras. São memórias que hoje guardo com uma ternura imensa.
Entre Gerações…
….Talvez seja hora de deixarmos de ver os avós como “obsoletos” ou como ameaça à coerência educativa. Eles não são inimigos da parentalidade moderna — são pontes. Podem não saber tudo sobre inteligência emocional, mas têm um saber que vem da vida. E isso não se ensina em nenhum livro.
O desafio está em encontrar o equilíbrio. Em ensinar aos nossos pais como queremos educar os nossos filhos, sem os silenciar ou humilhar. Em abrir espaço para que contribuam, sem impor. Em explicar que há coisas que mudaram — e tudo bem. Mas que outras continuam a ser fundamentais: como o amor, o colo, o tempo de qualidade.
Porque no Fim…
….as crianças não precisam de adultos perfeitos. Precisam de adultos que se escutem, que se respeitem, que se entendam. Precisam de famílias onde a sabedoria não é descartada — é integrada. Onde o passado não assombra — ilumina.
Talvez ser avô seja isso mesmo: tentar fazer agora com calma o que antes foi feito com pressa.
E talvez ser pai ou mãe hoje seja compreender isso — sem rancor, mas com consciência.
Porque quando diferentes tempos se escutam, o amor encontra espaço para crescer.
E nas memórias que ficam, o tempo da Vila Faia pode valer mais do que mil horas de bonecos.
E tu?….que memórias tens com os teus avós?
Como é que eles influenciaram a tua forma de ver o mundo?
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